terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O futuro já começou.


Deixando a festividade do título de lado, a questão do tempo sempre foi fundamental no pensamento ocidental. A ponto de Heidegger considerar a possibilidade de esclarecer o sentido do ser através da temporalidade. É, e não é, sobre isto que este rascunho pretende falar.
Não se faz necessário retroceder através da história do pensamento para mostrar os desdobramentos da idéia de tempo através dos diversos pensadores que trabalharam com ela. Basta lembrar que temos sempre a idéia de três modos temporais nos orientando, e que a temporalidade é composta pelos três.
Passado e futuro são, respectivamente algo que não é mais e algo que ainda não é. Ou seja, são em certo ponto modos temporais fora da experiência . Por outro lado, o presente não existe. Ou melhor, só existe como resultado dessa tensão entre a essência e o projeto, passado e futuro. No entanto é o momento fundamental para o homem, pois é nele que se dá a escolha. A nossa maior condição, a liberdade (e a responsabilidade que ela implica), aparece no presente, a cada instante, a cada escolha.
Por questões históricas do momento atual da humanidade e também por aquilo que Heidegger chama de decadência, acabamos por pender para extremos. Quase sempre o que fazemos é orientado para o futuro e esquecemos o momento fundamental de onde esse futuro parte. Várias e várias vezes nos impedimos de experienciar as coisas por medo do grande vilão do amanhã. E esta escolha é uma escolha já feita, porém não por nós mesmos. Só fazemos as coisas como se faz, nos perdendo no "impessoal". Não é que não se deva pensar no futuro, até porque somos projeto também, mas devemos tentar viver as experiências com a consciência de que somos-para-a-morte. Afinal, como diz Vinícius de Moraes: "não se engane não, a vida é uma só". E é este o sentido da angústia em Heidegger: sabermos que somos finitos. É também o problema de Camus: "...em todos os dias de uma vida sem brilho o tempo nos leva. Mas chega uma hora em que temos que levá-lo." Nietzsche: "...sempre há nossos filhos." Sartre, entre outros...
Por outro lado ocorre o desequilíbrio oposto também. A angústia outrora adormecida pelas ocupações com os eternos projetos, de repente aparece. O indivíduo então tem um velamento de seu campo de possibilidades e cai na decadência também. Perde-se no impessoal da mesma forma, pois não sabe lidar com algo assim. Ele passou a vida toda anestesiado e de repente tem que lidar com um vazio que surge do (no) nada. Às vezes é necessário que alguém lhe devolva ao cuidado, às vezes ele encontra seu caminho sozinho, mas nunca é fácil passar por isso. Então ele tenta buscar outras formas de anestesiar-se da existência. Deus, álcool, nicotina, maconha... enfim, qualquer uma destas drogas tem a possibilidade de consumir sua vida de alguma forma.
Neste segundo caso porém, esta angústia pode ser positiva. Já se sente o peso da existência e da responsabilidade como nunca se sentira antes. Este é o primeiro passo. Alguns conseguirão o que o Camus chamaria de permanecer no absurdo. "(o homem) Pode então decidir aceitar a vida em semelhante universo e dele extrair suas forças, sua recusa à esperança e o testemunho obstinado de uma vida sem consolo." É experimentando a liberdade mais real, porém finita, a liberdade de ação, que se pode chegar a essa positividade. Quando se alcança a eterna revolta consciente contra qualquer sentido previamente estabelecido, quando se sente o peso de sua responsabilidade, quando temos a intempestividade em cada escolha, a vida certamente ganha intensidade e profundidade.
Heidegger coloca a decadência como modo de ser do Dasein, pois a cada instante ele é em jogo com seu ser, logo podendo ganhar-se ou perder-se onticamente a vida toda. Mas Nietzsche traz algo de que não podemos esquecer: a vontade. Mesmo nos sabendo errantes em nosso ser mesmo, através da vontade podemos buscar uma vida mais autêntica possível.

2 comentários:

Unknown disse...

Eu escolho não fazer a escolha. Ops...
Gostei demais do texto, cara. Não tenho o que criticar pq o veneno ainda ta sendo destilado. Mais tarde quem sabe eu volte. Com uma bomba.

Émile Robot disse...

Deus, álcool, nicotina, maconha...

Tái uma coisa que posso dizer que ao invés de afastar o homem da sua noção do presente, o faz refletir sutilmente sobre os seus vários estados mentais. Com excessão do álcool é claro, anestésico desde os seus primeiros usos.

Apesar de não os considerar drogas, o consumo da própria vida independente de como se faça, isso sim é a real droga.

Concordo em vários pontos que você fala, minha tristeza é perceber que várias pessoas não tenham a luz dessa sabedoria.