segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Viva o consumismo!


O comediante George Carlin em seu vídeo maravilhoso sacaneando os Dez Mandamentos fala que a cobiça é boa pois é o que sustenta a economia. De fato ele está certo, afinal como diz a psicanálise, somos sujeitos desejantes, mas até onde isso pode nos levar?

Sabe-se que vivemos na sociedade de consumo onde os indivíduos são bombardeados por informações que tentam despertar neles a necessidade de comprar várias coisas, muitas vezes sem utilidade. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman atenta para isto em sua obra "Globalização - As consequências humanas", em um tom meio psicanalítico ao dizer que o bom consumidor não deseja a prometida satisfação de uma necessidade, ele deseja o desejo. E deseja tanto que faz da espera suscitada pelo desejo, um modo de vida. Um carro que lançou, uma nova grife, uma nova fragância, um novo detergente, a todo instante surge algo NOVO, e esta necessidade do novo, o desejo do desejo, é consequência de uma sociedade governada pela economia. O Estado está fragmentado, a economia está atingindo o grau máximo de liberdade e isto gera alguns efeitos desastrosos.

A produção em larga escala faz com que tenhamos todo dia um lançamento de um produto no mercado. As pessoas em determinadas regiões fazem fila nas portas das lojas quando lhes é prometida a chegada de algo novo no mercado. Enquanto isso assuntos importantes à respeito da sociedade são completamente esquecidos e cada um só quer saber de garantir o seu quinhão neste admirável mundo novo. O Estado agora fragmentado cada vez mais perde força, não consegue garantir suas funções essenciais perante a sociedade, está completamente a serviço das grandes empresas, e parece ter como função somente separar as maçãs podres das boas em seus grandes presídios, utilizando o padrão impessoal de objetividade das belas leis da imensa constituição brasileira. Além de outras questões que escapam mas estão ligadas a mesma problemática.

Mas que isso importa? Eu tenho meu carro zero, comprado antes que eu terminasse de pagar o anterior, mas eu não podia perder a redução do IPI, mesmo que tenha tido de fazer um financiamento por um banco que vai me cobrar taxas que farão com que o carro saia pelo dobro do preço. Nem me importo também se corro o risco de ficar sem grana pro bandeco, pior seria deixar de pagar o carro e perdê-lo por causa do contrato do financiamento. O que me resta fazer agora é colocar um som bem grande na mala e desfilar por aí exibindo minha ignorância e falta de erudição pela minha bela cidade provinciana. Tenho uma camisa Brooksfield, que combino pessimamente com meu Nike Shox, e um MP-X que vem com a maior revolução depois do cartão de memória: o descascador de alho! Além de continuar servindo como celular. A minha vida é boa porque sou rico da graça de Deus, mas bem que eu preferia ser rico de grana mesmo como aquele cara em quem eu votei na última eleição, ou aquele jogador ídolo que é um exemplo de vitória, enquanto outros milhões de vitoriosos, que sustentam a família com 465 reais, passam despercebidos no anonimato da cotidianeidade. Azar o deles, eu não quero é pensar nesse negócio de vida, sociedade, humanidade... ou melhor, não quero é pensar. Bem melhor quando a gente tem alguém pra pensar pela gente.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Celebridades na Pós-Modernidade.

Em sua obra sobre o processo de globalização e suas consequências humanas (de mesmo nome), o sociólogo polonês Zygmunt Bauman lança luz ao processo de formação do domínio do Estado moderno até seu estágio atual (pós-moderno).

Em meio a essa discussão ele retoma a brilhante idéia de Michel de Foucault sobre o Panóptico, para mostrar que aquilo de que outrora o Estado se utilizou para conquistar o espaço, agora já não funciona da mesma maneira. Mas o que isso tem a ver com o mundo das celebridades?

Aparentemente nada. O Panóptico de Foucault é uma representação da forma de domínio do Estado moderno onde os indivíduos vigiados não podem perceber seus vigilantes que podem mover-se livremente no alto da torre, de forma que os vigiados jamais percebam quando eles estão ou não lá, e se sintam coagidos a agir sempre dentro das regras impostas a eles. Bauman irá revelar que o Panóptico não mais é por si só suficiente para representar fielmente a forma de domínio que existe hoje na pós-modernidade, mostrando que na realidade, outra forma de poder cresceu paralelamente na contemporaneidade, devido aos grandes avanços da tecnologia e a força obtida pela economia no tripé estatal (economia, militarismo e cultura), porém não mais como "dominação", mas sim agora como "estilo de vida". Foi a evolução dos meios de comunicação.

No modelo proposto por Foucault poucos poderiam observar muitos, mas na pós-modernidade a idéia do Sinóptico de Thomas Mathiesen aparece como a outra possibilidade mencionada anteriormente: muitos observam poucos. Isto é o que? Justamente o mundo das celebridades. Elas que são pessoas "globais", no sentido baumaniano, que podem mover-se livremente, não são "locais", não estão presas ao espaço, vivem no tempo, são cosmopolitas, chegam e saem quando querem dos lugares e sempre são bem recebidas, são admiradas e principalmente seguidas. O foco do Sinóptico então, diferentemente do Panóptico, está justamente nos vigilantes, não mais nos vigiados.

A TV ajuda o Estado a cumprir seu papel de policiamento da sociedade. Ela dita as regras, as últimas tendências, os modelos de conduta e as pessoas se deixam seduzir, pois querem atingir aquele nível de mobilidade, de vida. Querem ser globais também, e por isso querem imitar, seguir aquilo que é ditado, na esperança de algum dia chegar a ter uma vida semelhante. Dessa forma, a grande maioria das pessoas, localizadas, sem a possibilidade de mover-se, de chegar à extraterritorialidade do espaço virtual da comunicação restrito aos "globais", se conforma com (e é convidada a) observação das celebridades, e abandona-se a seu devaneio de sonhar com a possibilidade daquele lifestyle sem procurar fazer algo de fato para mudar sua própria realidade.

Enfim, este é apenas um recorte feito dentro do que se pode pensar a respeito do controle social dentro da pós-modernidade. Há outros fatores políticos mais amplos que podem ser pensados relacionados também com esta situação.

E este texto é praticamente uma resenha de um trecho dum livro do Bauman chamado "Globalização, As Consequências Humanas", que recomendo muito.