segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Liberdade, ética e controle na Terapia Comportamental.


Liberdade e controle no Behaviorismo Radical


O pensamento behaviorista de B.F. Skinner surge em meio a um período marcado pela desconfiança na humanidade devido às Grandes Guerras. Nesta época, onde começam a surgir movimentos que atuam como tentativa de resgatar este homem que está desacreditado, os valores essenciais do homem e da sociedade estão sendo constantemente repensados, dentre eles principalmente a noção de liberdade.

O exemplo das Grandes Guerras pode ser considerado como algo que deixa marcadamente claras na história da humanidade as relações de dependência entre o homem e o ambiente que o controla, na medida em que numa situação limite como esta, ficam explícitas as mais diversas formas de controle principalmente através da violência. Trata-se de um evento que ilustra bem o que diz Castanheira (2007):

A história da humanidade mostra como ela foi construída pelo uso de poder e do controle, com os povos mais poderosos utilizando reforçadores e punidores dos mais diversos tipos para dominar, abusar e controlar o comportamento dos indivíduos, grupos e povos menos poderosos e destituídos. (CASTANHEIRA, 2007, p. 09).

Esta visão é uma visão skineriana que, tendo surgido num momento de reconstrução dos valores humanos, aliado a um histórico de recusa a toda idéia de controle culturalmente construída ao longo da história da humanidade, gerou os mais diversos tipos de reações.

A liberdade, que sempre foi tema de reflexão do homem, até a época de Skinner, era pensada ainda como total ausência de controle, como um agir como se quer. Ele, porém, desenvolve um modelo teórico que coloca o comportamento humano como sempre mantido por variáveis de controle, que causam e incidem sobre o comportamento, alterando ou mantendo sua frequência.

O que Skinner elabora é uma alteração do modelo de Pavlov de comportamento reflexo (S-R) para considerar também as variações e a seleção destes comportamentos através de suas consequências, inspirando-se no modelo darwiniano de seleção natural e nos experimentos de Thorndike sobre a relação temporal entre as respostas e suas consequências. (Laurenti, 2009).

Na verdade, esse modelo explica a origem e evolução do comportamento seguindo uma estrutura chamada tríplice contingência, que especifica um conjunto de condições antecedentes, respostas e consequências. Nessa perspectiva, um novo comportamento é gerado quando, diante de condições específicas, respostas (variações) são selecionadas pelas consequências que produzem. (LAURENTI, 2009, p. 252).

A partir desta nova concepção de comportamento, Skinner pode pensar mais amplamente a complexidade das interações humanas com o ambiente.

O ambiente não apenas cutuca ou sacode, ele seleciona. Sua função é semelhante à da seleção natural, e foi deixado de lado pela mesma razão. Agora é evidente que devemos considerar o que o ambiente faz a um organismo não somente antes, mas depois de sua resposta. O comportamento é modelado e mantido por suas consequências. Uma vez que esse fato seja reconhecido, podemos formular a interação entre organismo e ambiente de forma bem mais ampla (SKINNER apud LAURENTI, 2009, p. 256).

Tendo elaborado o modelo de seleção por consequências, que além de levar em consideração as consequências dos comportamentos, considera também a relação temporal entre os eventos, Skinner formula uma visão do desenvolvimento humano dividida em três esferas: a filogênese, a ontogênese e a cultura.

A filogênese está relacionada com a herança genética (características biológicas), a ontogênese à história de vida pessoal de cada um, e a cultura, o contexto social em que o sujeito está inserido. Estas três esferas em interação constituem o repertório comportamental do sujeito.

Considerando isto, fica claro o que já foi dito a respeito do homem: ele está submetido a inúmeras variáveis de controle. Como consequência disso a teoria skineriana é alvo de muitas críticas quanto à sua visão de homem, porém, na maioria das vezes não fica claro se esta noção de controle foi devidamente compreendida.

O que Skinner quer dizer com controle não é uma privação, uma repressão, mas sim diz respeito à “relação funcional entre eventos naturais, entre os quais se inclui o comportamento humano.” (Laurenti, 2009), ou seja, trata-se de um conceito científico.

Dizer que o comportamento é controlado significa, simplesmente, que o comportamento está em relação de dependência com outros eventos. Dito de outro modo, Skinner emprega o termo para chamar a atenção para o fato de que o comportamento tem “causas”, e que uma ciência do comportamento deve identificá-las e descrevê-las. Todavia, vale lembrar que dizer que o comportamento é controlado não implica a tese de que o comportamento é determinado. (LAURENTI, 2009, p. 262).

Logo, não há uma oposição necessária entre controle e liberdade. O problema é que as pessoas não identificam nenhuma causa para o comportamento operante sob reforçamento positivo, o que lhes dá a falsa sensação de uma conduta que partiu de “dentro”, da vontade (Brandenburg & Weber, 2005). Normalmente elas não se dão conta de que pode haver um controle aversivo por estarem sob reforçamento positivo imediato, alimentando concepções de liberdade errôneas, generalizando que toda idéia controle significa repressão. Isto não é verdade tendo em vista o que já foi abordado até aqui. “Contra essa generalização, Skinner afirma que a luta pela liberdade não seria uma luta pela liberdade do controle, mas de certos tipos de controle.” (Laurenti, 2009, p. 264)

Dessa forma, para o behaviorismo radical, liberdade não é a simples ausência de punição, ou seja, fazer o que se quer sem ter que sofrer consequências desagradáveis, mas a possibilidade de discriminação das variáveis de controle que influenciam o comportamento humano. (Brandenburg & Weber, 2005).


Ética e liberdade na Terapia Comportamental


A Terapia Comportamental é um modelo clínico de atendimento sustentado pela filosofia behaviorista de B.F. Skinner. Ela tem como objetivo garantir a autonomia do sujeito diante das variáveis de controle às quais ele está submetido.

Pautada no modelo skinneriano, a TC é uma possibilidade prática para os ideais de se construir uma ciência do comportamento humano que possibilitasse melhores condições de vida, visando a um contexto social menos coercitivo e ameaçador. (Laurenti, 2009).

A TC visa à utilização de técnicas e procedimentos, como o treino, que levem a pessoa não somente a alterar alguns comportamentos-problemas, mas, e principalmente, a ter a capacidade de descobrir as contingências que os mantém. (Guilhardi apud Castanheira, 2007). Portanto, ao final de todo processo terapêutico, o terapeuta deve proporcionar ao cliente identificar, sozinho, as variáveis que controlam seu repertório comportamental para que ele possa, também sozinho, alterar sua interação com o ambiente de modo que aumente a frequência de comportamentos saudáveis.

O terapeuta comportamental deve agir de forma transparente e honesta, implica que deve ter de forma clara as noções de liberdade e controle na sua prática, além, claro, de um embasamento teórico que o permita identificar e conduzir a terapia junto com o cliente. Dessa forma, ele poderá não somente ajudar a descobrir a solução para o problema do cliente, mas também ajudá-lo a mudar de modo que ele próprio se torne capaz de descobrir. (Skinner apud Castanheira, 2007).

É precisamente quanto a este papel sobre a autonomia do sujeito que a ética da Terapia Comportamental está de acordo com a noção de liberdade skineriana, e, é exatamente nisto que repousa sua ética:

A Terapia Comportamental estará mais próxima de uma postura ética quando oferece a oportunidade de aumentar a liberdade do cliente, tornando-o assim, mais apto a lidar com seu ambiente; quando almeja aumentar seu repertório comportamental para torna-lo mais livre e dono de seu destino (quanto mais comportamentos, mais opções, mais liberdade; quando adere a uma metodologia experimental e possui métodos adequados de avaliação; quando não afeta a dignidade da condição humana, mas serve para aumenta-la enriquecendo o indivíduo e sua contribuição à sociedade. (CASTANHEIRA, 2007, p. 19)

A ética na Terapia Comportamental é considerada como autocontrole, um tipo de controle específico adquirido na história de reforçamento do sujeito dentro da comunidade. Ela se diferencia do comportamento moral, por este ter reforçadores imediatos e estar mais próximo do hábito. (Castanheira, 2007). Dessa forma, uma prática ética é algo mais amplo que regula os comportamentos morais.

A proposta skinneriana então, ganhando contornos na prática clínica, pode promover práticas sociais adequadas que levam a pensar objetivamente a possibilidade de uma sociedade mais organizada. Dessa forma, a filosofia behaviorista levada aos setores mais importantes de controle da sociedade (economia, política, etc.), como era previsto por Skinner pode não ser uma realidade total, mas ajuda o homem a poder refletir sobre suas ações e as consequências dela para si e para o ambiente.

Assim, concordando com Castanheira (2007), o behaviorismo não tem a intenção de encobrir as relações funcionais que existem no controle do comportamento humano, mas sim de poder levar o sujeito a discriminá-las, podendo assim se adaptar melhor ao ambiente. Ao contrário das perspectivas pretensamente humanistas que não possuem um critério científico rigoroso, o behaviorismo pode mostrar a realidade humana de maneira mais fiel em todos os seus aspectos, evitando assim, que as pessoas sejam meros “escravos felizes”, como trazido por Laurenti (2009).

É claro que existem grandes dificuldades no dia-a-dia da clínica, independentemente da abordagem ou modelo prático, mas se o terapeuta comportamental tiver princípios éticos, há uma grande chance de sucesso em seu trabalho. Para isto é imprescindível que ele se permita trabalhar suas próprias questões, quando necessário, além, é claro, de estar bem sustentado nas questões metodológicas do behaviorismo radical. Isto o levará a ter maior quantidade de opções, maior amplitude de ações, garantindo mais liberdade (verdadeira) ao seu cliente.

Obs.: O que a gente não faz pela aprovação na academia...

Um comentário:

márcio disse...

A importância do behaviorismo é ter chegado bem perto ( talvez o mais perto possível) de inserir a psicologia na lógica do pensamento técnico-científico.Ao ponto de podermos encontrar aqui nesse texto a própria liberdade enquanto produto técnico-científico. pautado em dogmas da meta´fisica moderna, tais como causalidade, objetividade, tempo e espaço linear e homogêneo, o behaviorismo é uma construção realmente admirável. Tal como aponta Luis claudio figueiredo ele consegue escapar (dentro de uma empreitada animada pelo espírito positivista) à idéia de um mecanicismo no comportamento humano , ainda que não completamente a uma espécie de maquinismo. Mas dentro dos limites do que socio-culturalmente engendra a psicologia, acho que é a expressão máxima do que se ansiava por ciência psicológica. A ciência não pensa. E isso não é uma crítica. Foi o que disse heidegger, eu finjo que acredito.AH, não consegui ler teu texto todo. Só quis participar.